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Como ativar o power house corretamente: desmistificando o fechar as costelas.

Introdução

Você utiliza o comando verbal nos exercícios de Pilates incentivando seu aluno a “fechar as costelas”?

Se sim, pense bem e tente responder para si mesmo, por quais razões?

Talvez a maioria dos Professores que utilizam esse comando o fazem por um motivo principal:

Fechar as costelas significa, supostamente, ter mais ativação do power house (definido aqui de forma grosseira como os músculos do CORE, ou CENTRAIS).

Logo, para ter mais ativação do CORE utiliza-se, nos momentos de maior alavanca e sobrecarga para a coluna, tempos expiratórios e fechamento das costelas como uma técnica que aumentaria a estabilidade da coluna no exercício.

Esse tipo de comando e sua técnica de movimento correspondente possuem como fundamento a crença de que é importante uma pré-ativação dos músculos centrais do corpo antes do aluno começar a se movimentar, em qualquer exercício, e que o transverso abdominal, como um dos músculos mais importantes que compõe o CORE, teria uma ativação mais efetiva na fase expiratória, fechando as costelas.

Porém, é importante se perguntar: essa premissa encontra algum tipo de respaldo na comunidade científica hoje?

Todos nós sabemos da importância dada à região central do nosso corpo dentro do método Pilates, que, convencionalmente foi chamada de “centro de força”. Mas será que isso é uma proposta que vem das concepções originais de Joseph Pilates?

Percorri seus escritos inúmeras vezes e nunca encontrei uma linha se quer sobre o tal conceito de “centro de força” ou “power house”. Muito possivelmente esse conceito foi introduzido no mundo do Pilates posteriormente por dois motivos:

1) A cultura de movimento do Ballet Clássico que teve uma influência muito grande dentro do método, principalmente depois da morte de Joseph Pilates em 1967, com alguns de seus discípulos diretos do mundo da dança. No Ballet Clássico um dos pressupostos da técnica respiratória e de movimento é o fechamento das costelas e o crescimento axial.

2) Devido aos estudos dos pesquisadores (Hodges e Richardson, 1996, 1998) que perceberam o atraso na atividade do músculo transverso abdominal (reflexo antecipatório postural) em pessoas com lombalgias crônicas. A atividade do músculo transverso abdominal estava ausente no período anterior ao movimento e, portanto, não foi capaz de preparar a coluna para a perturbação resultante do movimento do membro. Essas descobertas, possivelmente, fizeram o mundo do Pilates adotar o princípio da estabilização segmentar do núcleo como uma proposta útil para processos de prevenção, reabilitação e treinamento visando performance, associando essa ideia de “fechar as costelas” e colocar o “umbigo para dentro” como uma técnica de movimento que busca estabilidade.

O problema é que muita coisa mudou de lá para cá, e o próprio Paul Hodges em entrevista para a revista BJSM, afirmou haver um equívoco sobre esse assunto, veja os pontos principais:

Sobre o conceito de ESTABILIDADE

“Um dos problemas é que as pessoas costumam interpretar estabilização como redução de movimento, a ideia de que você faz alguém ficar mais estável tirando movimento. No entanto, dentro de uma perspectiva biomecânica e fisiológica a estabilidade do CORE relaciona-se com ótimo controle, ou seja, um equilíbrio entre movimento e rigidez…… precisamos ter movimento para transferência de forças através do corpo”.

Sobre o suposto protagonismo do TRANSVERSO ABDOMINAL (TVA).

“Muito do trabalho que nós realizamos tem sido focado em alguns músculos e a confusão que isso causa é a ideia de que possam haver músculos mais importantes do que outros e as pessoas passaram a falar em músculos estabilizadores, eu penso que a coisa mais importante a se ganhar, do que nós entendemos de como a coluna é controlada, é que todos os músculos são importantes e necessários para realizar demandas funcionais. Então você não pode ter apenas só um músculo para oferecer controle, em toda função você terá uma orquestra muscular envolvida, e músculos diferentes podem fazer coisas diferentes, porque eles possuem vantagens biomecânicas diferentes, inserções anatômicas diferentes, e relações diferentes com outras funções, por exemplo, alguns músculos do tronco te ajudam a respirar enquanto te ajuda a manter o controle, não existe um músculo que como mágica te faz ficar estável”.

Se o leitor quiser ter acesso a parte dessa entrevista, entre no link abaixo:

A questão principal relacionada com o tema, para nós professores de Pilates, talvez seja o fato de que acabamos dando ênfase demasiada à tal ativação do ‘Power house”, incentivando nossos alunos com técnicas como o “fechar as costelas” e colocar o “umbigo para dentro” que podem interferir negativamente no controle motor da coluna por aumentar demasiadamente a rigidez do núcleo, impedindo a transmissão de energia e de movimento entre os segmentos corporais.

Outra consequência grave, pode estar relacionada com a ineficiência respiratória durante o movimento, já que ao fechar as costelas impedimos o trabalho livre do diafragma e também do controle da pressão intra-abdominal realizado pelo próprio transverso abdominal.

Vou explicar melhor!!

Quando inspiramos o ar, o transverso age como um antagonista do diafragma distribuindo a pressão intra-abdominal para cima, o que contribui para a ereção do tronco, de um lado, e evita o excesso de pressão na pequena bacia de outro (Campignion, 1998).

Isso quer dizer que existe contração excêntrica do transverso abdominal quando inspiramos o ar, ele não se ativa somente na fase expiratória como muitos pensam, levando consequentemente os alunos a realizarem força somente na fase da expiração (algo completamente disfuncional); e também que podemos interferir de maneira negativa nessa transferência de pressão interna quando incentivamos os alunos a manterem as costelas fechadas inclusive na inspiração, pois se ela não pode ser transferida para cima, porque encontra pouco espaço pelo fechamento das costelas, o único lugar que ela pode se direcionar é para baixo, na pequena bacia.

Conclusão

1) Estabilidade relaciona-se com a capacidade que um corpo tem em armazenar energia potencial (fáscia) e transformar em energia cinética para o movimento, para isso o jogo rigidez x mobilidade deve estar equilibrado!

2) O TVA tem um papel de apenas 2 a 3 no processo de estabilização, ele não é o ator principal e nem mesmo trabalha sozinho. Nosso sistema nervoso central e de controle motor não possui a capacidade de isolar sua ativação de forma voluntária. Ou seja, você não vai conseguir ativar transverso abdominal isoladamente.

3) Fechar as costelas ou colocar o umbigo para dentro são técnicas de movimento que podem interferir negativamente no processo de estabilização da coluna (por aumentar ao longo do tempo sua rigidez e por interferir na dinâmica de distribuição de pressão intra-abdominal.

4) O professor de Pilates deve se preocupar em ganhar o maior grau de liberdade de movimento da caixa torácica, em todos os planos de direção, para que a respiração possa se encaixar de acordo com cada movimento e tipologia corporal.

5) Os estabilizadores mais importantes para o movimento são específicos de acordo com a tarefa, não tenha obsessão pelo transverso abdominal.

A mudança de paradigma do conceito de power house é algo que pode contribuir para um Pilates mais funcional, abaixo deixo minha contribuição para essa mudança :

Power house para mim é:

Uma forma de organização do gesto motor que dá ao corpo e ao movimento a característica de coesão, possibilitando uma sensação de unidade. Essa organização deve desconstruir a ideia de hierarquia de uma região do corpo em relação à outra, mas sim atuar no sentido da orientação de como conduzir a energia de movimento, do centro para as extremidades assim como das extremidades para o centro, mantendo níveis suficientes de estabilidade e mobilidade segmentar de acordo com a tarefa realizada.

AlexLuzzi

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Referências bibliográficas

1. Campignion, Philippe – Respir-ações: A respiração para uma vida saudável – São Paulo: Summus, 1998.

2. Feldenkrais, Moshe – Consciência pelo movimento (tradução de Daisy A. C. Souza); São Paulo, Summus, 1977.

3. Ferrari, Alfonso Trujillo – Metodologia da pesquisa científica: Macgraw, 1982.

4. Fiasca, Peter – Descubriendo el Pilates Clássico Puro: Teoría y Práctica conforme a la intención de Joseph Pilates, 2012.

5. Galliano, A. Guilherme – O método Científico: Harperhow, 1979.

6. Kolyniak Filho, Carol; Garcia, Inelia Ester – O autêntico método Pilates de Condicionamento físico e mental (contrologia): Contribuições para uma fundamentação teórica. São Paulo: The authentic Pilates Studio Brasil, 2012. 2⁰ edição.

7. McGill, Stuart – Core Training: Evidence Translating to Better Performance and Injury Prevention. Spine Biomechanics; University of Waterloo, Ontario, Canada. Vol32; n°3; 2010.

8. Marés G, de Oliveira KB, Piazza MC, Preis C, Bertassoni L Neto – A importância da estabilização central no método Pilates: uma revisão sistemática. Fisioter Mov. 2012 abr/jun;25(2):445-51

9. Pilates, Joseph Hubertus – Escritos (Your Health & Return to life of through contrology): The authentic Pilates Studio Brasil, 2012. 228p.

10. Poletto R, Toigo AM. Efeitos da prática do Método Pilates em atletas de diferentes modalidades. Revista Saúde e Desenvolvimento Humano 2017;5(2):59-65.

11. Richardson. C, Hodges. P.W, Hides. J – Fisioterapia para estabilização lombopélvica: um sistema de controle motor para tratamento e prevenção da lombalgia – São Paulo: Phorte, 2011 2⁰ edição.

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